Fish,
steak, pizzas e pastas
A areia está quente.
- Mamã,
mamã, os pés ardem muito!
O choro de socorro de nada lhe vale. Para quê
chorar se ninguém ouve quem chora?
Está sol. A areia quente queima. Os pés
estalam. As falésias ensimesmadas de castanho emolduram a massa humana ensaboada
de areia e salpicos de água.
- Mamã, mamã, tenho os pés a queimar! Mas a mamã
não responde.
Grupos de estrangeiros caminham apressados
para o fresco das águas. Um bando de jovens do leste estende-se ao sol e fica
por ali a corar a pele excessivamente branca que iria avermelhar cedo. Um casal
de alemães, ou que falava alemão, carrancudo, caminha ao longo do espraiar das
águas, seguidos por uma ciganita com um pequenote de carranha dependurada.
Aqui fala-se Inglês. Os Ingleses, irlandeses…
vão valendo nos solavancos do turismo.
Retrocedemos
quarenta anos!
O
Algarve ou o “Allgarve”, como a falta de senso pretendia, volta a não estar
português. Voltou a ser “outro lado mar”. É o poente português da subserviência que vende
o próprio nome. (Registe-se este nobre provincianismo - “Allgarve”- no livro de
propaganda de seis milhões de euros, das coisas fenomenais e subsecivas).
As
ementas regressam massivamente em Inglês. A saudação volta a ser good morning, e o thank you que antecipa o good-bye
é prato do dia. A língua francesa passeia-se pouco por aqui. Espanhóis…não são
os de outros tempos, mas continuam a olhar as montras dos restaurantes e a
pedir sardinhas.
Quando
se ouve um “bom dia”, nos intervalos de quem passa, ou à mesa de um café - restaurante
da rua principal, o queixo do
empregado recolhe-se, a testa engelha-se e o sorriso fica amarelo. “Bom dia”… não
está na ementa afixada.
Por
todo o lado há fish, meat, steak, chicken piri-piri, eggs e
bacon, também pizzas e pastas. Só
o restaurante é português.
Sardinha
assada, vinho tinto, bacalhau com todos e o pão caseiro acabaram, não se
escrevem em português.
Retrocedemos
quarenta anos. Perdemos o brilho. Ficámos com sol, sem luz, sem coragem e sem
euros. Ainda bem que outros nos visitam com os euros que nos dão tanto jeito.
Parece que regressámos ao “Allgarve” da idiotice. As ementas não são caras,
mas os extras pesam demasiado. Entendam-se os restaurantes com os Ingleses e
alemães. Tenham muita cerveja que eles trazem a moeda que nos hipotecaram. Que
venham! Sejam muitos!
Os
portugueses voltam a ficar à espera de sonhos do seu Algarve.
- Mamã, tenho os pés a arder!
- Já passa… corre para ali, está mais fresco.
- Mamã, mamã…
Abriram
o chapéu-de-sol e abrigaram-se da areia quente, das ementas esbraseadas e do
dia de amanhã que já queima os pés dos meninos. Ao longe balbucia-se uma suave
e fresca brisa.