quinta-feira, 19 de julho de 2012

Correm ventos duros nas escolas portuguesas


Nas escolas portuguesas, correm ventos duros. Cada vez mais agressivos. Pisam a segurança e o tempo passado, longo, como se nunca tivesse acontecido.

(N) As escolas portuguesas trituram o passado, como se não tivesse existido e ao presente negam toda a esperança, matando o futuro. Ser pessoa já não conta. A confiança e a serenidade foram desbaratadas e substituídas pela ansiedade e pelo medo. Os professores transformaram-se em números que produzem mais números e papéis. Construtores da sociedade, desceram à categoria de objetos descartáveis em qualquer momento.

Nas escolas portuguesas, expulsam-se as pessoas que “viveram a escola” dez, quinze, vinte, trinta anos. Passaram, tristemente, a valer tanto como o tempo de trabalho do amanhã que não existe: “zero”.

Nas escolas portuguesas, há pessoas (já nem como pessoas são consideradas!). Calaram-se os professores e os professores não se podem deixar calar. Estão todos no mesmo barco. Estamos no mesmo barco. E todos nos calámos quando era preciso gritar. Agora é preciso recuperar a dignidade estilhaçada.

Para os professores portugueses, um abraço de solidariedade. Outro abraço – grande – para os professores da minha longínqua escola, onde o vento duro teima continuar a soprar, cada vez mais duro.


quarta-feira, 4 de julho de 2012

Chicken piri-piri



Fish, steak, pizzas e pastas
 A areia está quente.
  - Mamã, mamã, os pés ardem muito!
O choro de socorro de nada lhe vale. Para quê chorar se ninguém ouve quem chora?
Está sol. A areia quente queima. Os pés estalam. As falésias ensimesmadas de castanho emolduram a massa humana ensaboada de areia e salpicos de água.
- Mamã, mamã, tenho os pés a queimar! Mas a mamã não responde.

Grupos de estrangeiros caminham apressados para o fresco das águas. Um bando de jovens do leste estende-se ao sol e fica por ali a corar a pele excessivamente branca que iria avermelhar cedo. Um casal de alemães, ou que falava alemão, carrancudo, caminha ao longo do espraiar das águas, seguidos por uma ciganita com um pequenote de carranha dependurada.
Aqui fala-se Inglês. Os Ingleses, irlandeses… vão valendo nos solavancos do turismo.

Retrocedemos quarenta anos!

O Algarve ou o “Allgarve”, como a falta de senso pretendia, volta a não estar português. Voltou a ser “outro lado mar”. É o poente português[1] da subserviência que vende o próprio nome. (Registe-se este nobre provincianismo - “Allgarve”- no livro de propaganda de seis milhões de euros, das coisas fenomenais e subsecivas).

As ementas regressam massivamente em Inglês. A saudação volta a ser good morning, e o thank you que antecipa o good-bye é prato do dia. A língua francesa passeia-se pouco por aqui. Espanhóis…não são os de outros tempos, mas continuam a olhar as montras dos restaurantes e a pedir sardinhas.
Quando se ouve um “bom dia”, nos intervalos de quem passa, ou à mesa de um café - restaurante da rua principal, o queixo do empregado recolhe-se, a testa engelha-se e o sorriso fica amarelo. “Bom dia”… não está na ementa afixada.

Por todo o lado há fish, meat, steak, chicken piri-piri, eggs e bacon, também pizzas e pastas. Só o restaurante é português.
Sardinha assada, vinho tinto, bacalhau com todos e o pão caseiro acabaram, não se escrevem em português.
Retrocedemos quarenta anos. Perdemos o brilho. Ficámos com sol, sem luz, sem coragem e sem euros. Ainda bem que outros nos visitam com os euros que nos dão tanto jeito.

Parece que regressámos ao “Allgarve” da idiotice. As ementas não são caras, mas os extras pesam demasiado. Entendam-se os restaurantes com os Ingleses e alemães. Tenham muita cerveja que eles trazem a moeda que nos hipotecaram. Que venham! Sejam muitos!

Os portugueses voltam a ficar à espera de sonhos do seu Algarve.
- Mamã, tenho os pés a arder!
- Já passa… corre para ali, está mais fresco.
- Mamã, mamã…

Abriram o chapéu-de-sol e abrigaram-se da areia quente, das ementas esbraseadas e do dia de amanhã que já queima os pés dos meninos. Ao longe balbucia-se uma suave e fresca brisa.



[1] al-garb - ”oeste, poente, ocidente””