o manto diáfano da
fantasia
(Epígrafe de “A Relíquia” de Eça de
Queirós
AVALIAÇÕES (5º
e último ato)
IX
– Leituras e relatórios. Um passeio pelo teatro
As escolas “ensaiam” os
encontros, preparam documentos, as linhas de luz e as peças de teatro a levar à
cena durante dois ou três dias. Há reuniões com tudo e com quase todos. A
equipa de avaliadores chega a uma escola, esquece-se de Molière e manda subir o
pano do palco. Dá-se início à representação. Na boca de cena, o grupo de
trabalho avalia. O público não ri, não bate palmas, nem assobia.
Representada a estória, o
pano cai e a vida prossegue. Depois vem o relatório. Alguns estabelecimentos
reclamam, contraditam, mas isso é um exercício didascálico sem retorno: se os
atores principais são os mesmos, a resposta é sempre a mesma. Não conheço ”mise
en scène diferente”.
Quando leio alguns
relatórios, fico com uma vaga perceção de que, sem alterar o discurso, nem os
adereços de cena, o “Bom”, poderia ser substituído pelo “Suficiente”, ou o
“Muito Bom” por “Bom” ou “Excelente”. Depois dos elogios, os textos dos
relatórios enervam-se (que não é coisa de bons atores) e enchem-se de “mas…”,
“no entanto…” de “conselhos” e de algumas propostas. A avaliação fica feita e o
cineteatro pode fechar as portas porque o público já abandonou o “foyer”. Irá
reabrir alguns anos mais tarde, aguardando que o tempo divulgue nova
programação com outros atores e melhores textos teatrais.
Os relatórios permitem uma
leitura que releva, como sendo a vertente mais negativa de diversas escolas, as
práticas pedagógicas, os resultados, a organização do trabalho, as estruturas
intermédias, a indisciplina. Digamos que não é pouca coisa para tão grande
cenografia.
Diz-me o contra-regra que esta
leitura-percurso pela avaliação deixa muitas dúvidas: como já referi, excluindo
a capacidade de autorregulação, campo que não irei abordar, as áreas de gestão
e de liderança são as que têm melhores avaliações, enquanto os outros domínios
(resultados e a prestação do serviço educativo) são os que aparecem com mais
críticas negativas.
É isto que não entendo.
X
– Por exemplo
Li recentemente um relatório
que, tal como outros, “bate” nos resultados e na prestação de serviços, atribuindo-lhe
“Bom”, “Suficiente” ou “Insuficiente”, já não me lembro bem. Os quadros
intermédios são castigados com palavras pouco elogiosas, mas o diretor, ou a
diretora, recebem elogios pela sua liderança e gestão escolar. Não entendo.
Explique-se, nem que seja com um desenho: os quadros intermédios foram
indicados pelos diretores (as) das escolas e a organização do serviço educativo
também é da sua responsabilidade; a disciplina, ou indisciplina, passa pela
orientação, atuação e responsabilidade da direção…então, a liderança e gestão
escolar é que é boa, ou muito boa, e são as estruturas intermédias - direta ou
indiretamente nomeadas - que não cumprem?
Numa qualquer empresa, se os
resultados não são bons e se a prestação de serviços é sofrível, a direção é
substituída pois corre-se o risco da empresa falir. Porém… avaliar
negativamente as áreas de organização e gestão de uma escola não seria o ruir
da cadeia de comando? Com o consulado da ministra Maria de Lurdes tornaram-se,
prioritariamente, representantes do ministério e das estruturas governativas e
não a voz das escolas junto dessas estruturas. Nem todos os diretores (as)
procedem assim. Mas… (há sempre um “mas”, nestas coisas) Ninguém avalia
negativamente quem o representa. Se os avaliadores o fizessem e se fossem
coerentes, teriam que propor a sua demissão. E isso não pode acontecer.
Já que estamos a falar de
poderes e de avaliação, expliquem-me, nem que seja com outro desenho de cena:
não são os diretores (as) que avaliam os quadros intermédios, com “Bom”, “Muito
bom” “Excelente” ou “Suficiente”?...E se esta avaliação não encaixar com a avaliação
externa relativamente à ação desenvolvida por estas estruturas?
Ah! Pronto! Entendi: são
campos diferentes de avaliação, há práticas, métodos, objetivos e itens
diversos a pesar na avaliação. Uma avaliação é global, organizacional, e outra
é individual. São áreas muito distantes uma da outra. Só o objetivo é o mesmo:
melhorar, procurar a excelência. Porém as cenas deste teatro não encaixam nos
atos desta peça.
XI
- Fechem o pano. Mudem de comédia.
A implementação destes
processos desgastou avaliados e avaliadores. Alguns - quero acreditar que
foram muito poucos - “sentiram-se bem” porque,
pela primeira vez, poderiam “ter na mão” (exagero meu!) os seus colegas de
trabalho. Só não se desgastaram os bolsos dos viajantes de papéis e dos
formadores que foram construindo ações fabuladas de informação formativa, as
tipografias, os donos das fotocopiadoras, os produtores de papel, a EDP - as
reuniões prolongavam-se pela noite dentro – o café e as farmácias curadoras do
cansaço.
Poucos acreditam nas mais-valias
do processo. Nem os que sofregamente adocicaram a vida, maquilhando-se nos
camarins, com dois dedos de poder feito de mal-estar. E quando não se acredita
no que se faz (se é feito é porque a pintura da caracterização legislativa diz
para se fazer) fica-se pelo preenchimento de papéis informatizados e de flores
que ditam um número qualitativo que faz doer.
Fechem o pano! Mudem de
comédia! Escrevam novo texto de teatro! Levem à cena novo espetáculo!
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